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Mitigação do Nexo Causal

A Responsabilidade Civil é o ramo do Direito Civil menos regulamentado pelo legislador.

O uso de cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados demonstram a necessidade de investigação deste ramo do direito e o dever de observá-lo à luz do caso concreto. Uma das características desta linha do direito civil são seus fundamentos: (i) agente causador do dano; (ii) evento dano; (iii) nexo causal; e (iv) culpa quando se tratar de Responsabilidade Civil Subjetiva.

Sucede que a Responsabilidade Civil brasileira vem sofrendo uma mudança paradigmática durante os últimos anos conforme bem demonstra Anderson Schreiber em seu livro Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil: Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos.

Trata-se de um período de quebra de conceitos que eram considerados fundamentais para a existência e manutenção desse ramo do Direito Civil Brasileiro, especificamente o nexo causal.

Buscando uma definição simplificada, nexo causal é o liame subjetivo entre a conduta e o resultado. Na visão de Gustavo Tepedino, a palavra que melhor define é causalidade[1]. 

Trata-se, na visão Francisco Arthur de Siqueira Muniz (2017, p. 248), de “um conceito pouco desenvolvido pelos romanos”[2], razão pela qual teorias foram desenvolvidas visando explicar a causalidade, são elas, ainda no trabalho elaborado por Francisco Arthur de Siqueira Muniz (2017, pp. 248-261): (i) equivalência das condições; (ii) causalidade adequada; e (iii) a teoria da causa direta e imediata[3].

Na visão de Gustavo Tepedino (2006, p. 64), a teoria aceita pelo Supremo Tribunal Federal, consagrado pela sua 1ª Turma no Recurso Extraordinário n. 130.764-1 PR no ano de 1992, bem como pelo Art. 403 do Código Civil[4] é a teoria da causalidade direta e imediata [5]. Desse modo, há alguns anos dizer ser possível a responsabilidade civil sem nexo causal era algo inimaginável. 

Sucede que, em decisão paradigmática no ano de 2009 o Superior Tribunal de Justiça – STJ em sede de Recurso Especial nº 1.056.540/GO decidiu pela possibilidade de responsabilidade civil sem nexo de causalidade.

No referido julgado o que se observa é a possibilidade de manutenção da responsabilidade mesmo se demonstrado que o agente causador do dano foi outro, conforme trecho da ementa: “Se possível identificar o real causador do desastre ambiental, a ele cabe a responsabilidade de reparar o  dano, ainda que solidariamente com o  atual proprietário do imóvel danificado”

Logo, o STJ, ao entender pela solidariedade da responsabilidade civil de obrigações propter rem, mesmo que possível a identificação do real causador do dano, acaba por mitigar um dos pilares da Responsabilidade Civil, qual seja o nexo causal.

Este tipo de responsabilização acaba por ocorrer mais no âmbito do Direito Ambiental, conforme informa Nelson Rosenvald (2017, p. 234): “em todas as suas mais recentes decisões [o Superior Tribunal de Justiça] insere a responsabilidade ambiental entre as hipóteses de aplicação da teoria dos risco integral desconsiderando aprioristicamente o nexo causal” [6].

Embora se trate de dano de natureza ambiental, a possibilidade de novos debates sobre eventual mitigação do nexo causal para responsabilização civil à luz do caso concreto tem sido objeto de discussão em artigos como os de Gustavo Tepedino [7], Francisco Arthur de Siqueira Muniz [8]e Nelson Rosenvald [9]e teses de doutoramento como a de Pablo Malheiros da Cunha Frota [10], principalmente após o precedente deixado pelo STJ.

Portanto, ao menos no que tange a Responsabilidade Civil decorrente de danos ambientais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem sido menos estrita quanto à exigência do nexo causal.

 

[1]TEPEDINO, Gustavo. Nexo de Causalidade: Anotações Acerca de suas teorias e a Análise controvertida Casuística no Direito Brasileiro. In: BARBOSA, Mafalda Miranda; MUNIZ, Francisco. Responsabilidade Civil: 50 anos em Portugal 15 anos no Brasil, pp. 303-325. Salvador: Editora JusPodivm, 2017

[2]MUNIZ, Francisco Arthur de Siqueira. Das Retóricas da Causalidade à Imputação Objetiva: Lineamentos para a Responsabilidade Civil pelos Danos decorrentes de Doenças Vetoriais. In: BARBOSA, Mafalda Miranda; MUNIZ, Francisco. Responsabilidade Civil: 50 anos em Portugal 15 anos no Brasil, pp. 233-276. Salvador: Editora JusPodivm, 2017

[3]Ibidem

[4]CC/2002, Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei procesusal

[5]TEPEDINO, Gustavo. Notas sobre o Nexo de Causalidade. In: TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil: Tomo II, pp. 63-81. Rio de Janeiro, Editora Renovar, 2006

[6]ROSENVALD, Nelson. O direito Civil em Movimento: Desafios Contemporâneos. Salvador, Editora JusPodivm, 2017

[7]Cf. TEPEDINO, Gustavo. Notas sobre o Nexo de Causalidade. In: TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil: Tomo II, pp. 63-81. Rio de Janeiro, Editora Renovar, 2006 e TEPEDINO, Gustavo. Nexo de Causalidade: Anotações Acerca de suas teorias e a Análise controvertida Casuística no Direito Brasileiro. In: BARBOSA, Mafalda Miranda; MUNIZ, Francisco. Responsabilidade Civil: 50 anos em Portugal 15 anos no Brasil, pp. 303-325. Salvador: Editora JusPodivm, 2017

[8]Cf. MUNIZ, Francisco Arthur de Siqueira. Das Retóricas da Causalidade à Imputação Objetiva: Lineamentos para a Responsabilidade Civil pelos Danos decorrentes de Doenças Vetoriais. In: BARBOSA, Mafalda Miranda; MUNIZ, Francisco. Responsabilidade Civil: 50 anos em Portugal 15 anos no Brasil, pp. 233-276. Salvador: Editora JusPodivm, 2017

[9]Cf. ROSENVALD, Nelson. O direito Civil em Movimento: Desafios Contemporâneos, pp. 233-235. Salvador, Editora JusPodivm, 2017

[10]Cf. FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Imputalçao sem Nexo Causal e a Responsabilidade por Danos. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Federal do Paraná. Paraná, 2013

Rodrigo Acioli

2019 Caneca Jurídica

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